Jornalista Joaquim Lannes dá vida e transparência ao jornal-laboratório

O jornalista Joaquim Lannes, da Universidade Federal de Viçosa (UFV), fez palestra sobre o tema “OutrOlhar – Uma proposta pedagógica do jornal Laboratório Cidadão”, editado nessa universidade. A conversa foi densa e doce, literalmente, porque ele levou alguns potes de doce de leite Viçosa para sorteio entre os alunos presentes ao encontro. A palestra foi recheada de exemplos sobre a cronologia do jornal-laboratório da UFV e sobre a vida desse excelente jornalista. Cerca de 100 alunos de Publicidade e de Jornalismo da Unigranrio concentraram suas perguntas em curiosidades sobre os bastidores da produção, além das dúvidas de quem vai lidar com humanismo, tecnicismo e as idiossincrasias do cargo. Lannes teve fôlego para falar durante quase duas horas, incluindo o time para responder às várias perguntas ao final de sua palestra. Foi show de profissionalismo e de humildade, tão difícil nos dias de hoje. Valeu, Joaquim Lannes.

Como evitar os erros e vícios dentro do jornalismo
O auditório da Unigranrio parecia uma sala de aula, porque o ambiente foi ficando descontraído e pra lá de interessante. Cada aluno recebeu cinco exemplares do jornal OutrOlhar. Entre um piscar de olhos nas páginas e nas notícias, nossos alunos anotavam os pontos principais da palestra, já pensando em formular perguntas ao doutor em jornalismo. Lannes costurou sua palestra com cerca de 50 slides e um fôlego de maratonista. Fred Schiffer, diretor de Marketing da Unigranrio, mediou o encontro com histórias bem divertidas: “Ontem, o Lannes e eu entramos pela madrugada, lá em casa, em Petrópolis, com objetivo de preparar a palestra dele. Mas a conta vai ficar cara, porque consumimos vinho e muita reflexão, além da conta de luz”, brinca Fred, que conclui a conversa com altos elogios ao grande amigo.
Lannes, doutor em Comunicação e Cultura pela Universidade Federal do Rio de janeiro (UFRJ), mostrou o caminho que leva à qualidade, veracidade e credibilidade
Ele direcionou sua palestra aos alunos de jornalismo ensinando que o jornal-laboratório é o lugar certo de errar, de ousar e de aplicar os conhecimentos teóricos, feito com base em pesquisas sistemáticas em todos as áreas. Para ele, as experimentações constantes de novas formas de linguagem – tão em moda –, de apresentação gráfica e de conteúdo dão a cara do jornalismo moderno. Segundo Lannes, os princípios básicos que norteiam a teoria à prática ainda passam por ensino, pesquisa e extensão, com ênfase em interdisciplinaridade e forte formação humanista, como referências intrínsecas.
Lannes conta sobre o aneurisma que o afastou da UFV por quatro meses. Seus medos se foram e ele continua na estrada, ainda melhor
Lannes dá uma pausa na palestra, respira fundo e, emocionado, conta sobre um dos períodos mais difíceis de sua vida: “Eu sou sobrevivente por duas vezes, meus amigos. Em determinado momento em que o jornal OutrOlhar estava indo muito bem, tive que tirar licença de quatro meses para tratamento de um aneurisma de aorta. Eu soube que, naquele momento da cirurgia, chegaram a dizer que eu tinha poucas chances de sobrevivência, talvez 5% apenas. Eu dei a volta por cima, resisti bravamente, contei com muitos amigos e voltei à vida e ao trabalho. A partir daí, reformulei o projeto gráfico com apoio de meus colegas, e deixamos o jornal mais leve e mais dinâmico”, relembra.
A História de sucesso do jornal OutrOlhar tem em Lannes o grande “oftalmologista de jornalismo”
Lannes vê tudo de forma cristalina e diferenciada, inclusive sobre a nova safra de profissionais cidadãos, prontos aos desafios de Minas Gerais e de todo o território brasileiro. Ao dar uma rápida passada nas últimas edições desse jornal, fica claro que Lannes provoca seus alunos para o ineditismo e para o front da notícia, sempre com ética e visão coletiva de trabalho: “Em breve, nós vamos realizar um concurso para promover a nova identificação do jornal OutroOlhar, que acaba de completar 10 anos. Eu tenho orgulho de trabalhar com tantos formadores e opinião e de promover ensino de qualidade aos acadêmicos de jornalismo. O nosso jornal também é voltado para a comunidade, já que este ofício é abrangente e, ainda, personaliza aqueles que escrevem os artigos. Ele é de entretenimento, de informação e que incentiva o processo de leitura”, conta Lannes, já de olho para não exceder o tempo da palestra. Ele deixa a todos o endereço para quem desejar conhecer o curso de jornalismo da UFV: www.com.ufv.br.


Qual a importância da publicidade dentro da área de jornalismo?
Lannes/Fred – “Na verdade, nós estamos produzindo jornal e, para isso, temos que vender este produto. A comunicação é um todo dentro do processo, porque engloba conteúdo e a comercialização. Sendo assim, os dois caminham juntos”, ensina Lannes. Fred Schiffer vai de carona na pergunta para esclarecer: “Hoje, o jornalismo bebe nas águas da publicidade, mas o inverso também acontece. O futuro, me parece, que é a integração das duas áreas de comunicação”, acrescenta. Lannes pede a palavra para ir mais adiante: “No jornalismo da UFV, no 7º período, havia a disciplina de Assessoria de Imprensa. Eu solicitei que a mesma fosse ampliada para Assessoria de Comunicação à Imprensa. Hoje, é necessário que o profissional tenha embasamento em relações públicas, publicidade, jornalismo, tudo de forma integrada”, conclui Lannes.

Você acha que os alunos de ensino médio foram influenciados a fazer jornalismo, devido ao trabalho dos alunos da Universidade Federal de Viçosa?
Lannes – “Nessa edição comemorativa pelos 10 anos do nosso jornal, selecionamos alunos que liam as edições do OutroOlhar, no ensino médio e que vieram a escolher o curso de jornalismo. Por exemplo, o Rafael, nosso ex-aluno, atualmente no mestrado, disse que o sonho dele é ocupar o meu lugar no jornal da faculdade, lá na UFV. Outros que também beberam desta mesma fonte seguiram caminhos semelhantes. É o caso de um ex-aluno de jornalismo que trabalha na secretaria do curso, além de outra que, depois de fazer mestrado e doutorado, voltou para ocupar o posto de coordenadora de jornalismo de nossa universidade”.

Qual a grande importância do jornal-laboratório em relação aos grandes jornais?
Lannes – “Nós do jornal-laboratório não temos a pretensão de competir com os jornais. O jornal que vocês receberam é o mesmo que, a cada edição, eu encaminho a uma banca de jornais, do meu amigo Fernando, para que ele distribua aos seus clientes. Acontece que grande parte dos jornais publicam releases, ou seja, não tem sistema de apuração, sendo que o jornal-laboratório segue a linha daquilo que se espera de um veículo de imprensa”.

De quem é a responsabilidade de colocar o jornal em circulação e, ainda, se o governo federal banca o custo total de produção?
Lannes — “A responsabilidade é minha e dos alunos, mas a ajuda governamental é muito restrita. Eu pensei editar jornais alternativos, sobre esporte e cultura, por exemplo, com objetivo de ampliar o número de edições ao longo do ano. Hoje, eu tenho quatro edições anuais, embora o MEC estipule 10 delas. Com esta nova perspectiva, eu reuni os alunos e começamos a cumprir a meta do MEC, que prevê um jornal por mês. Nós distribuímos nossos tablóides por escolas públicas e as principais bancas de jornal. A edição especial dos 10 anos do OutroOlhar teve 25 mil exemplares. Alguns colégios trabalham as matérias que nós produzimos e, logo após, enviam os recortes dessas edições para outras turmas, digo outros alunos.

Nós pensamos fazer um site de notícias. Qual a receita de sucesso para se fazer isso?
Lannes — “A primeira coisa que precisamos pensar e na segurança, ao criar web notícias a partir da rua. Pensem bem, porque vocês não têm experiência de mercado e, com isso, podem ser utilizados, como fonte, por políticos. Tudo pode ser feito, desde que vocês tenham a supervisão e orientação de professores de jornalismo da universidade. Quanto à linha editorial, recomendo que também discutam com seus mestres e coordenadores de ensino”.

Qual a estratégia que vocês usaram para atrair alunos do ensino médio?
Lannes — “Em primeiro lugar, nós procuramos identificar o gosto e as pautas de interesse deles, direcionando as matérias nesta linha de pensamento. Quando eles pegam o nosso jornal, eles sabem que se identificarão com temas que estão ligados ao dia a dia deles. A nossa distribuição é feita de mão em mão, isso reflete neles algo muito positivo e personalizado. Muitas vezes, nós levamos alunos de ensino médio para dentro da nossa redação. Lá, nós colaboramos para que eles desenvolvam um informativo para ser colocado nos murais da escola. As estratégias são vocês que decidem, porque deve ter um eixo de sedução, por assunto e abordagem, por exemplo”.

Quais as principais dificuldades de se fazer um jornal impresso?
Lannes — “Eu poderia enumerar algumas. O relacionamento com o grupo de trabalho é uma das principais. Nas redação, todos nós nos deparamos com pessoas que não gostamos, mas que, por força do trabalho, temos que conviver de forma harmônica. Outra coisa é o contato com as pessoas, porque na maioria das vezes as secretárias impedem, momentaneamente, que façamos as entrevistas no tempo que necessitamos. Quando alguém sai do jornal com uma pauta, pela manhã, sabe-se que na volta á redação, alguém vai cobrar estas respostas, custe o que custar. É tirar leite de pedra, como dizemos na gíria. Há uma série de dificuldades para se produzir um jornal. Certa vez, um aluno foi cobrir uma manifestação no Centro do Rio e levou umas cacetadas de policiais, que estavam tentando acabar com uma briga entre manifestantes. Todo cuidado é pouco, mas podem ter a certeza de que vão cobrar o conteúdo das pautas propostas”.

Lannes – “Eu respondo, primeiro, a você, Kimberlly. A opinião da escola sobre a editoração do jornal produzido por nossos alunos é sempre é respeitada, desde que seja bem fundamentada. Quanto à resposta ao Max, a minha opinião é a de que a base do jornalismo você aprende no jornal-laboratório. O que difere é a linguagem a ser usada, já que o texto utilizado no site, no jornal impresso, na TV ou no rádio são completamente diferentes. As pessoas ainda usam textos de jornais na internet, porque isso está, ainda, em evolução. Quando eu vejo algum aluno com quatro ou cinco laudas de uma matéria, eu digo que dificilmente aquilo será lido. É necessário que se identifique a característica do veículo em questão, já que os jornalões costumam trazer matérias com muito conteúdo”.